quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Capítulo Um
Fevereiro, 2000

Algumas pessoas simplesmente nasciam para serem mães.
Casar, cuidar de uma casa e construir uma família, esse sempre havia sido o sonho de Demetria. Típico, alguns pensavam, fácil demais, diziam que ela deveria sonhar mais alto. Ela, porém, não queria. Estava satisfeita com seu sonho.
E estava orgulhosa de si mesma por estar conseguindo realizá-lo, Demetria pensava com um sorriso no rosto enquanto se arrumava para sair. John, seu namorado há três anos, iria logo pedi-la em casamento, então comprariam uma linda casa, onde seus filhos cresceriam. Sabia que ainda era nova para tudo isso, não tendo nem vinte e quatro anos completados, mas sentia como se estivesse se preparando para esse momento por toda sua vida.
- Está pronta? – John apareceu na porta de seu quarto, cansado de tanto esperar – Vamos, Demi, acabaremos perdendo a reserva.
- Eu já estou indo. – Ela se virou para o namorado, dando-lhe um beijo delicado nos lábios – Podemos ir agora.
Ela passara o jantar todo nervosa, sentia sua mão tremer e cada vez que ficavam em silêncio, começava a suar, esperando o momento. Porém John nunca fazia nada. Isso não estava certo, ele tinha que pedir hoje. Certo, não tinha, mas Demetria estava certa que pediria, qual então seria o motivo de todo esse jantar? Desde seu primeiro ano de namoro, eles só saíam juntos em datas comemorativas, e não havia nada naquele dia, até onde Demi sabia.
- Então, - Demi começou, já irritada com a lentidão de John – Qual o motivo disso tudo? – Como John pareceu não entender, ela completou: - O jantar e tal, qual é a ocasião?
- Bom, eu ia esperar para contar, mas não vejo motivos para isso – Ele fez um suspense, e então sorriu – Eu fui promovido! Lembra que te contei que meu chefe iria se aposentar e alguém teria que ficar em seu lugar? – Demi assentiu – Então, ele me escolheu para ocupar o cargo!
- Nossa... Isso é ótimo, John! - Tentou fingir que estava animada com a notícia.
- Não é? – Ele pareceu não notar seu desapontamento – Meu salário vai aumentar bastante, acho que finalmente vou conseguir comprar aquele carro!
Um carro? A decepção ficou estampada no rosto de Demetria. Pensava que ao menos ele iria sugerir uma viagem ou para comprarem um apartamento juntos, mas um carro era extremamente decepcionante. John estranhou o comportamento da namorada.
- O que foi? Qual é o problema em comprar um carro, Demetria? – Ele pareceu ficar na defensiva – Quer dizer, eu já tenho um apartamento mesmo e tudo mais, tenho que investir em alguma coisa.
- É claro que tem, não estou reclamando. Só acho desnecessário, afinal você já tem um carro.
- Mas não um assim!
Demetria resolveu não discutir. Precisava se contentar com aquilo, não? Afinal, ainda teria muito tempo para se casar.

Mais tarde, naquela mesma noite, Demetria pensava em seu futuro com John, enquanto ele dormia tranquilamente ao seu lado. Estava cansada de esperar. O namorado parecia satifeito onde estava, investia mais em sua carreira do que no relacionamento, e não demonstrava nenhum interesse em constituir uma família com ela. Mas o que Demi faria se ele não quisesse as mesmas coisas que ela? Ela o amava, não amava? Ela lembrava da excitação do primeiro encontro deles, de como ela estava feliz e depois como eles estavam apaixonados um pelo outro, mas agora eles haviam caído na monotonia. Falavam-se todos os dias, mas passavam a maior parte da semana sem se verem e, para falar a verdade, Demi não sentia falta dele, caso ficassem sem se ver por algum tempo.
- Pare de se mexer, Demetria – Ele reclamou, então se sentou na cama, observando a namorada – Você está inquieta desde o jantar, o que aconteceu?
- Eu só estava aqui pensando... Você nunca pensou em ter uma família, John? – Ela perguntou, sem encarar o namorado nos olhos – Casar, ter filhos...
- Por que está pensando nisso, Demi? Isso é bobagem, estamos bem assim, não estamos? – Ele questionou, franzindo a testa – O que você quer dizer? Você quer isso?
Ela suspirou, chegando à óbvia conclusão que John não a entenderia. Como podia? Era algo que estava dentro dela, uma necessidade inexplicável de ter uma família.
- Sim, eu quero isso, John. –respondeu, com um tom levemente irritado.
- Desde quando? Desculpa, querida, eu te amo, mas não posso te ajudar. Eu odeio crianças, sabe disso. E nunca mencionei que pretendia casar, quem sabe daqui uns dez anos, mas definitivamente não agora. Estou no meio da construção da minha carreira, não tenho tempo para me preocupar com futilidades. – Ele resmungou – Agora, esqueça isso e volte a dormir, tenho que acordar cedo amanhã.
- Sabe, John? Acho melhor eu ir para casa agora. – Ela se levantou e começou a vestir suas roupas.
John ficou estático no lugar, sem entender o que ela fazia. Apenas se levantou quando percebeu que a mulher saía do quarto, vestida e carregando sua bolsa.
- O que você está fazendo? Por que está indo embora? Você está muito estranha hoje, Demetria.
- Estou indo porque não vejo motivos para continuar. Olhe John, foi bom enquanto durou, mas, obviamente, nós não estamos caminhando para o mesmo lugar. Nós dois queremos coisas diferentes.
- Você está terminando comigo? – Ele franziu a testa, ainda confuso.
- É o que parece. Desculpe John, espero que possamos continuar amigos. – Ela saiu antes que ele pudesse dizer alguma coisa.
Demetria apenas olhou no relógio quando já estava na rua. Não eram nem quatro horas da manhã. Sentiu-se idiota ao lembrar que estava sem carro, pois fora John quem a buscara e, ainda mais estúpida, ao perceber que só tinha seu cartão de crédito e identidade dentro da carteira, nenhum dinheiro. Talvez John descesse atrás dela daqui alguns minutos.
Ela esperou algum tempo, e ninguém veio. A rua estava completamente vazia, e mesmo se ela tivesse como pegar um táxi, teria que andar, o que não seria muito interessante: seus sapatos a estavam matando.
Andou um pouco até achar alguma escadinha, e se sentou. Começou a chorar antes que pudesse perceber, e pensou em como era ridícula. Uma mulher bem-vestida, sentada na calçada chorando de madrugada. Ela tinha terminado com John! Como isso tinha acontecido? Algumas horas antes, estava animada porque iria encontrá-lo.
Pegou o celular e ligou para Selena, na esperança que ela estivesse em casa, porém ninguém atendeu. Droga, Sel, quando eu preciso você não atende, Demi pensou. Digitou outro número rapidamente, enquanto tentava limpar as lágrimas.
- Kevin? – Ela disse quando atenderam no outro lado da linha.
- Hm, não. – Alguém sonolento respondeu.
- Como não? Esse não é o celular dele? – Demetria ficou confusa, tentando reconhecer a voz masculina.
- É, mas acho que ele esqueceu o celular aqui. Sei lá, eu estava dormindo. – Explicou – Quem é?
- É a Demetria.
- Hey, Demi, é o Joe. Tudo bem aí? Sua voz está estranha... Você sabe que são tipo três e meia da manhã, não sabe? Não é um horário muito legal de se ligar.
- Desculpe, Joe, não sabia que o celular de Kevin estava com você. Sabe onde posso encontrá-lo? É meio que uma emergência.
- Não sei não. Mas o que é? Quem sabe eu posso ajudá-la –se ofereceu, notando o tom choroso de Demi – Você estava chorando?
- Eu estou na rua, sem carro e sem dinheiro. Mas não quero incomodá-lo, posso ligar para outra pessoa.
- Em qual rua você está? Chego aí em dez minutos. A não ser que você esteja em outra cidade, aí vai demorar mais algum tempo! – Ele riu.
Demetria sorriu, cedendo sua localização para o amigo. Não queria abusar da boa vontade de Joesph, mas ela precisava voltar para casa e, na verdade, não tinha muita gente que poderia buscá-la.
Quinze minutos depois, Joe parou, abrindo a porta para Demetria adentrar o veículo.
- Estou atrasado em cinco minutos, eu sei – Ele sorriu, cumprimentando a garota – Então, você vai me contar porque estava sozinha mendigando em plena madrugada?
Ela suspirou, pensando se deveria contar para Joesph que havia terminado com John. Bom, ele eventualmente descobriria, não é?
- Terminei com John e saí da casa dele, só percebi que não tinha como voltar quando já estava lá embaixo. Selena não atendia o telefone e nem Kevin, aparentemente – Explicou – Desculpa mesmo por te fazer sair de casa, Joe, eu não queria incomodá-lo.
- Não tem problema, eu nem ao menos estava sonhando. E sinto muito por você e John. Da última vez que o vi, ele parecia bem apaixonado por você.
- É, fui eu quem terminou com ele. Não ia dar certo.
Joesph parou na porta do prédio de Demi, a encarando com um sorriso no rosto. Demetria se questionava se ele era sádico, se divertindo com o fato de ela ter terminado um relacionamento de anos.
- Então isso significa que você está solteira novamente? – Ele perguntou e Demi ergueu uma das sobrancelhas – Quem sabe você não aceitaria sair comigo agora?
- Eu acabei de terminar um namoro, Joe, não acho que essa seja a melhor hora para me chamar para sair – Ela não pôde evitar rir um pouco.
- Verdade, isso foi muita insensibilidade minha – Ele se desculpou – Quem sabe daqui umas duas semanas?
- Veremos.
- Estarei esperando sua resposta – Ele respondeu sério, encarando-a e Demetria começou a gargalhar.
- Você é ridículo, Jonas! – Ela riu, então o abraçou, beijando sua bochecha – Mas obrigada, parece que estou te devendo uma agora. – Ela saltou do carro, virando apenas para acenar para ele, e entrou no prédio.
Conhecia Joe há quase nove anos e quase sempre havia sido assim entre eles. Faziam piadas um com o outro, mas nunca passava disso. Talvez agora que tinha terminado com John, alguma coisa finalmente acontecesse de novo entre eles, Demetria pensou. Esqueça isso, Demi, falou para si mesma, já faz muito tempo que você superou isso.
Era verdade que tinha um assunto meio inacabado com Joe, mas já tinham se passado muitos anos desde que eles haviam cogitado se envolver romanticamente. Agora eram amigos, talvez não tão amigos quanto antes, mas ainda assim não valia à pena pôr a amizade em risco.
Ao entrar em casa, Demetria encontrou Selena Falcon, sua melhor amiga e companheira de apartamento, jogada no sofá dormindo, com a TV ligada no volume máximo e vários papéis de chocolate jogados em cima da mesinha. Sel estava nessa fase já fazia mais de duas semanas, quando o namorado terminou com ela. Com certeza John não ficaria assim.
- Hey, cheguei – Ela cutucou a amiga – Não acha melhor ir para o quarto? Vai ficar com dor nas costas se continuar dormindo no sofá todos os dias.
- Estou ótima – Ela murmurou, e então se sentou, encarando a amiga com olhos esbugalhados e depois olhando para o relógio – O que aconteceu? Por que chegou a essa hora?
- Terminei com John – Falou, dando de ombros, e então se retirou para o próprio quarto.
Contou quinze segundos, enquanto se sentava na cama e tirava o sapato, até Selena aparecer boquiaberta em sua porta. Demetria riu com a reação totalmente previsível da amiga.
- Como assim? Ele terminou com você? E por que você está rindo aí, sem se importar?
- Eu terminei com ele, Selena, e já chorei, não adiantou nada – Explicou, terminando de tirar os sapatos.
- Mas... Você estava toda animada hoje de manhã. Eu achei que vocês fossem casar!
- Bom, esse é o problema: eu também achava. John não quer construir um futuro comigo, ele não quer casar nem ter filhos, e você sabe muito bem que eu quero isso. Não vejo motivos para continuar com alguém que não tem os mesmos objetivos que eu.
- Meu deus, Demi, não acredito que você terminou com ele só por causa disso. As pessoas mudam, amadurecem, logo ele vai ficar mais velho e vai querer ter filhos! E o casamento é só um detalhe, não é? Não faz mal não casar, é só morar junto e acabou – Ela falava rapidamente – Mas, calma, ele provavelmente irá te procurar, óbvio! Aí você vai pedir desculpas por ter agido como uma maluca e tudo vai ficar bem. Acredite, Demi, você não quer terminar, veja o que aconteceu comigo!
- Eu não sou você, Selena, não quero que John me procure. Já era hora de terminar, não estava mais dando certo.
Demetria deu boa noite para a amiga, expulsando-a de seu quarto e indo se deitar. Ela tinha que investir no que dava certo, não é? Talvez pudesse sair com Selena, conhecer pessoas novas, isso ajudaria as duas. Principalmente ela, que além de arranjar alguém pra si mesma, não teria mais que aguentar a crise de depressão da amiga. Quem sabe não devesse sair com Joe? O pensamento passou por sua cabeça antes que pudesse bloqueá-lo. Ele era passado.


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